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Entervista com Massimo Capaccioli

Massimo Capaccioli, o cientista nos lugares mais distantes do universo

Massimo Capaccioli, astrofísico e cientista italiano, é uma das figuras mais consagradas do mundo no âmbito das galáxias. Professor honorário da Universidade Estadual de Moscou Lomonosov na Rússia, cargo geralmente reservado para ganhadores do Prêmio Nobel, ex-diretor do Observatório Astronômico de Capodimonte em Nápoles, Itália, e professor nas Universidades de Padova e Nápoles, ele é o promovedor e o desenvolvedor do projeto VST, que em 2011 levou à construção do maior telescópio de rastreio do mundo em Cerro Paranal, nas montanhas andinas do Chile. Atualmente, está prestes a embarcar no desafio do século com o projeto SKA - Square Kilometer Array.


Franca Severini


O QUE É UM ASTROFÍSICO E QUAL É O OBJETO DE SUA PESQUISA? O objeto da minha pesquisa é astronomia extragaláctica. Esta é uma área da astrofísica moderna que abrange mundos com uma dimensão muito maior do que o nosso pequeno universo local - que compreende substancialmente o sistema solar e suas diversas estrelas - localizada a distâncias enormes de nós. Nós estudamos os diferentes componentes das galáxias e a história de cada galáxia, o que está voltado principalmente à vida, ou seja, a nós. Essa profissão constitui um privilégio absoluto, tendo o ensino como seu ápice. A comunidade de acadêmicos do cosmos é um nicho pequeno que se estende por todo o planeta: meus melhores amigos e também meus melhores “inimigos” estão localizados na Rússia e na América.

É um mundo internacional e o meu trabalho é maravilhoso. Eu o recomendo veementemente para todos os jovens que não têm medo de arrancar o coração do peito, jogá-lo longe e sair por aí em busca dele novamente. Se este é o tipo de estímulo que estão buscando, não há trabalho melhor no planeta. A astrofísica é uma ciência em rápida evolução que envolve diversas áreas do conhecimento e explora as tecnologias mais modernas utilizadas tanto em terra como no espaço. Uma das minhas tarefas, por exemplo, é determinar a idade do universo e sua aceleração atual em comparação ao enfraquecimento anterior do seu ímpeto inicial, o Big Bang. Atualmente, o VST (VLT Survey Telescope) também faz parte disso. É um telescópio que eu desenvolvi, construído e instalado no Chile, precisamente em Cerro Paranal, considerado o melhor local astronômico do mundo. Uma máquina perfeita que desde 2010 rastreia o céu do sul com seu grande olho.

O projeto italiano de importância mundial, em cooperação com o ESO (Observatório Europeu do Sul) e o OAC (Observatório Astronômico de Capodimonte) em Nápoles - agora parte do Instituto Nacional Italiano para Astrofísica - estimulou demais a exploração do universo em grande escala. O crédito para o enorme desenvolvimento recente na ciência do céu vai diretamente para a tecnologia, que promove todas as ciências. Com as devidas distinções, isso se aplica à tecnologia também utilizada no VST, juntamente com as habilidades necessárias para o seu design, que vem da indústria italiana. Excelência com amplitude planetária.


CADA VEZ É MAIS NECESSÁRIO RELACIONAR A CIÊNCIA COM A INDÚSTRIA EM DIVERSOS PAÍSES: OS ESTUDOS DE ASTROFÍSICA ESTÃO PRÓXIMOS DO MUNDO DA INDÚSTRIA? O QUE O SENHOR PODE PROPOR EM RELAÇÃO A ISSO? E VICE-VERSA? A resposta é dupla: há demandas da ciência para tecnologia. Nós recorremos ao tecnólogo para o projeto e a fabricação de máquinas cada vez mais refinadas que desempenham tarefas cada vez mais difíceis e precisas. Há uma série de demandas extremas tanto em terra como no espaço. O E-ELT, por exemplo, o telescópio europeu gigante que pesa 2.800 toneladas, será movido em um trilho de 70 metros com a leveza de uma libélula. E a missão Rosetta, que há alguns meses permitiu que o lander “Philae” conseguisse fazer um pouso suave em um corpo celeste, foi como disparar um projétil a 500 milhões de quilômetros no espaço para atingir outro alvo em movimento medindo 4 km por 4 km.

E um projétil fraco, pois para chegar ao cometa, ele teve de ser impulsionado por uma série de corpos planetários a fim de ganhar ímpeto suficiente. Na verdade, o lander passou por um problema trivial de baixa tecnologia na ativação do arpão que deveria tê-lo ancorado ao cometa e assim detê-lo no destino para onde foi precisamente lançado. A demanda para tecnologia vindo da astronomia é tremenda e estimula a indústria a sempre fazer melhor. Também há um retorno para tecnologia através das descobertas feitas pela ciência em geral, pela física, mas também pela astronomia. A astronomia é uma área especial da física; é a física dos “pobres”, porque enquanto o físico precisa de dinheiro para construir um laboratório para seus experimentos, o astrônomo já tem seu laboratório - um que Deus ajudou a criar e que é, portanto, bem equipado com todo tipo de... fenômenos, eu diria. Fenômenos que devem ser observados e entendidos.

Quando o astrônomo consegue entendê-los, ele passa as informações para o físico, que a seguir passa para o engenheiro e então para a indústria. Temos exemplos extraordinários de coisas que utilizamos diariamente e que se originam dessa sucessão: não somente relógios digitais ou TVs com tela de cristal líquido provenientes da mecânica quântica ou do estado sólido.Quando passamos pela verificação de segurança no aeroporto, devemos lembrar que o detector de raio X foi inventado por astrônomos para finalidades astronômicas, assim como o software TAC 3D foi originalmente desenvolvido para estudos celestiais. Assim, a ciência e a tecnologia compartilham uma relação simbiótica e eu não saberia dizer qual das duas veio primeiro. Eu não saberia dizer se Galileu Galilei foi primeiro tecnólogo e depois astrônomo, embora, é claro, ele tenha sido primeiro um tecnólogo, reconstruindo o telescópio inventado pelos holandeses e em seguida apontando-o para o céu.

Mas então ele percebeu que o que havia criado não era bom o suficiente e precisava ser aperfeiçoado. Portanto, a ciência precisou da tecnologia, e da tecnologia veio a ciência porque com sua invenção, Galileu inspirou mentes de todo o mundo, incluindo os jesuítas, mesmo em um mundo altamente impressionável em face dessas descobertas. A relação entre a ciência e a tecnologia é bastante próxima e circular: da ciência à tecnologia e da tecnologia à ciência. O problema é o dinheiro, ou seja, como essa relação é administrada. Se a indústria visa somente lucro, essa relação não funciona. E se os cientistas são obtusos e não percebem que devem ajudar a tecnologia e não se interessarem exclusivamente pela questão científica, a relação é rompida.


AONDE A RELAÇÃO ENTRE CIÊNCIA E TECNOLOGIA NOS LEVARÁ? Tudo isso nos levará muito longe. Com o projeto SKA (Square Kilometer Array), por exemplo: uma façanha tecnológica monstruosamente difícil, tão difícil que, atualmente, ainda não é viável mas que se tornará, porque se oferecemos aos tecnólogos recursos financeiros suficientes e estímulo suficiente, eles podem criar qualquer coisa. Ao mesmo tempo, o SKA é um empreendimento científico absolutamente extraordinário e as duas áreas andam juntas. É natural esperar que, após sua conclusão, teremos tantas patentes e invenções que nossas vidas mudarão, assim como nossa percepção do universo e da história.

Pense na Internet, uma invenção com consequências de maior alcance do que a de Guttenberg. A rede virtual criou um novo gênero humano (que talvez não seja melhor). Mas a primeira Internet foi criada no cenário científico, para transferência de dados. A divisão entre ciência e tecnologia é artificial, como em um boletim escolar, por exemplo, onde as matérias são divididas em diferentes colunas começando com “Comportamento”. Mas nós podemos distinguir claramente a história da filosofia? Ou a história da física? Talvez não. Tudo está interligado porque, por trás disso, há sempre a presença do homem.


QUAIS ENSINAMENTOS VOCÊ ADQUIRIU COM A EXPLORAÇÃO DO COSMOS? Eu aprendi que é possível enganar a todos, exceto a natureza, nossa principal companheira. Talvez seja melhor ser sincero, mesmo intelectualmente, a fim de ter uma boa relação com essa companheira.


O MAIOR ESTUDIOSO E AS PRINCIPAIS DESCOBERTAS. O inventor do pão toscano, um campeão da humanidade! Brincadeiras à parte, eu diria a penicilina. Ou o telescópio de Galileu. Ou a medição de Hipparcos das paralaxes das estrelas. Mas não vou falar isso. Não há uma única grande descoberta. O que posso dizer é que o homem, o mesmo que é capaz de monstruosidades inacreditáveis, de destruir cidades inteiras e de matar seus semelhantes, é o mesmo ser capaz de escrever poemas maravilhosos, compor músicas lindas, esculpir mármore e simultaneamente representar a natureza em sua linguagem misteriosa, que é matemática, conseguindo prever seus comportamentos. É isso que realmente impressiona todo homem da ciência e é isso que impressionou até mesmo um homem da envergadura de Albert Einsten, que disse que, entre tudo o que sabia, há algo que até mesmo ele não entendia. Nós somos capazes de falar uma língua que a natureza aceita e, por meio dela, prevemos atos da natureza que a natureza efetivamente honra.


HÁ OUTRAS FORMAS DE VIDA NO UNIVERSO? O universo existe há aproximadamente 14 bilhões de anos. O espaço no qual realizamos nossas observações tem uma dimensão enorme. Para cruzá-lo, para ir daqui até o surgimento dos eventos, precisaríamos de 50 bilhões de anos viajando na velocidade da luz. Nesta “bolha”, há 500 bilhões de galáxias, cada uma contendo 100 bilhões de estrelas. Cada uma dessas estrelas talvez tenha um sistema planetário; nós encontramos planetas semelhantes à Terra em estrelas que parecem o sol; cientistas em laboratórios reproduzem as moléculas da vida. Homens inteligentes na Terra são recentes e a Terra é um objeto minúsculo, incrivelmente pequeno dentro do cosmos. Eu não sei dizer se há outras formas de vida inteligente.

Eu ficaria surpreso e até mesmo um pouco aflito se não houvesse, porque isso significaria que nossa função no cosmos é extremamente importante. Se formos os únicos espectadores desse cenário fantástico, deveríamos viver protegidos sob uma cúpula de vidro, porque se desaparecêssemos, também desapareceria o único farol que observa essas maravilhas. Eu não posso dizer se existe um Pai Celestial; mas se há uma inteligência criativa, eu espero que ele ou ela tenha considerado não desperdiçar esse precioso tempo, espaço e energia atribuindo tudo a uma única espécie tão frágil e temporária. A espécie humana está à deriva de asteroides assassinos, de nós mesmos, de doenças e de um planeta que às vezes sofre de dores de estômago. Nós estamos navegando em um mar tempestuoso dentro de uma frágil casca de noz.

Eu espero que quem tenha feito tudo isso - se é que tal entidade existe - tenha diversificado o investimento criando outras inteligências em outro lugar para que, caso uma luz comece a tremular em um lugar, outra luz seja acesa em outro. Mas este é apenas um desejo meu, não uma verdade científica. Na dúvida, eu digo para as pessoas e para mim mesmo: “Vamos nos comportar apropriadamente!”, porque se estamos sozinhos no cosmos, temos uma responsabilidade enorme. Se não estamos, alguém pode chegar mais cedo ou mais tarde e eu gostaria que esse alguém nos encontrasse em boas condições para que não fiquemos com vergonha de nós mesmos.

Concordando com Kant, observando o cosmos e a inteligência do cosmos, talvez a humanidade possa fazer com que seu comportamento melhore em relação à própria humanidade, em relação ao planeta e em relação ao universo que observamos.* Biografia Carreira profissional: Departamento de Ciência Física, Campus de Monte Sant’Angelo, Universidade de Nápoles Federico II, Via Cinthia, 80126 Nápoles, Itália INAF - Observatório Astronômico de Capodimonte, Via Moiariello 16, 80131 Nápoles, Itália Graduações: 1969, graduação em Física (summa cum laude) na Universidade de Padova, Itália Cargos atuais: 1995 - atualmente: professor titular de astronomia da Universidade de Nápoles Federico II, Itália 2010 - atualmente: professor honorário da Universidade Estadual de Moscou Lomonosov, Rússia


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